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Bruno Weilemann

Rio de Janeiro/RJ, 1983. Vive e trabalha em Petrópolis/RJ.

Texto Crítico

Bruno Belo: Visão Fontana

Elisa Maia

 

“Visão Fontana”, primeira individual do artista petropolitano Bruno Belo, apresenta trabalhos em tela e papel, executados com tinta a óleo, acrílica, aquarela e pó de grafite. Com curadoria de Bruno Miguel, a mostra reúne na Galeria IBEU um recorte potente da produção mais recente do artista que se destaca pelo rigor da técnica e pela maturidade da pesquisa.

O título, Visão Fontana, retirado de uma poesia de Manoel de Barros faz referência à visão dos poetas que, assim como a sábia visão das crianças, seria capaz perceber as coisas como se as visse pela primeira vez, dando-lhes assim novos sentidos, imprimindo-lhes significados inusitados e, sobretudo, encantando-se com o que se poderia tomar por banal e costumeiro. As imagens espectrais de Bruno, que mesclam com delicadeza espaços e temporalidades distintas, favorecem processos de mudança de percepção. Suas paisagens possuem às vezes um caráter insólito e a inserção de elementos inusitados – um galo com rodas, uma silhueta feminina com uma máscara de urso – contribuem neste processo de desconstrução de significados sedimentados e abertura de novas rotas de sentidos.

Partindo da noção de “Cut Up” de W. S. Burroughs, Bruno apropria-se de fragmentos de imagens, textos, fotografias e referências cinematográficas que são projetados sobre a tela utilizando um equipamentos antigo de 100mm. Essas projeções são então pintadas umas sobre as outras resultando nas paisagens fragmentadas. As imagens multidimensionais de Bruno pedem tempo. É preciso que haja uma pausa para que as camadas se desvelem e revelem gradativamente através de suas transparências os diferentes planos que compõe a pintura.

A memória aparece como um elemento importante nos trabalhos, impondo-se não como o canal de acesso a alguma referência específica, mas antes como um fator de opacidade. Sabe-se que da memória nunca poderá resultar o encontro com um referente primeiro, pois através dela as experiências são editadas, fundidas, aumentadas ou suprimidas, resultando sempre em algo novo, diferente do referente que se pretende resgatar. As pinturas de Bruno dialogam com esse conceito de memória, pois embora partam de registros referenciais, não se colocam como ilustração da experiência. A potência de suas imagens parece derivar justamente da capacidade de construir uma atmosfera fantasmagórica que se equilibra entre a transparência e a opacidade, enfatizando não apenas o visível, mas também o que se estende para além do espaço da tela. Neste sentido, são importantes os apagamentos, as figuras que se liquefazem, os vestígios da ausência, as lacunas e o caráter de rascunho. O tema da memória comparece ainda no texto curatorial de Bruno Miguel, que traz fragmentos de lembranças pessoais do curador, desorganizadas cronologicamente e com menções ao filme de Michel Gondry, Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças de 2004.

Aristóteles afirma que a História diz o que foi, enquanto a poesia diz o que poderia ser. Neste sentido o universo construído por Bruno Belo aproxima-se desta última, pois não reproduz o visível, mas constrói visualidades singulares e, sobretudo, enfatiza novas formas de olhar.

(Texto extraído da revista DASartes, nº47, 2016.)

 

Revista DASartes: Garimpo - Bruno Belo

Elisa Maia

 

Em Purgatório (2013), de Bruno Belo, a imagem é percebida gradativamente. Uma sobreposição de planos e transparências aos poucos se desdobra evidenciando os vestígios das figuras que compõem o espaço multidimensional e fragmentado da tela. “Trabalho usando diferentes fotografias, extraídas de mídias diversas, algumas retiradas de contextos jornalísticos e outras mais genéricas, que vão se somando como que em camadas semitransparentes”, conta o artista, “a ideia é que essas imagens intercaladas causem ruídos sobre as outras”.

As referências às notícias jornalísticas também se fazem presentes por meio da escolha de alguns de seus títulos, como Protesto em Londres ou Conflito no Quirguistão. Mas embora a linguagem, substantivada e concisa, aponte na direção das manchetes de jornal, sua pintura não parte da transcrição mimética do referente, mas da recriação do que parece se assemelhar mais a uma atmosfera do que a uma paisagem realista “não é para ilustrar a experiência, mas revelar a nova substância”.

As imagens espectrais de Bruno parecem habitar os intervalos entre a figuração e a abstração. Os tons aguados e os contornos fugidios desenham figuras que se liquefazem e escorrem para além do espaço da tela. Nas fissuras entre as muitas camadas que compõem o trabalho, abre-se um espaço de discussão sobre a própria natureza das imagens, que se constituem “por adição” ou pela “fusão” de uma série de “citações” de referências distintas “processos derivados de fontes dessemelhantes em que as coisas se fundem e revelam uma convergência que não é unívoca; não reproduzem verdades, mas produzem sentidos”. Para saber mais sobre a obra de Bruno Belo, acesse www.brunobelo.com.br.

(Texto extraído da revista DASartes, ano 4, nº28, jun./jul. 2013.)

 

Notícias desmanchadas e choques liquefeitos: as imagens de Bruno Belo

Manoel Silvestre Friques e Luciana Paiva

 

“(…) O que fica impregnado nessas imagens é um espectro; contornos sobrepostos por imagens e áreas de ausência que também revelam figuras. Aqui, vale lembrar que o caráter pictórico da pintura de Belo está muito mais na sobreposição de imagens do que nas pinceladas, já que sua pintura liquefeita não lida apenas com adição de tinta sobre tela, mas com espaços negativos que sugerem figuras. Este talvez seja o ponto principal de sua poética, pois a escolha e o processo revelam uma íntima coerência com a temática. A aparente desconexão entre imagem e título é essencial, pois dá à notícia o seu lugar: o da fantasmagoria. (…)”

“(…) A diluição da imagem, agregada à estratégia de alusão da notícia pelo título, sugere um cansaço crítico em relação à objetividade do mundo jornalístico, que se prova efetivo apenas em sua insistente continuidade. Tal fadiga gera difusão, revelando uma imagem em transição, uma entre-imagem (BELLOUR) que escorre da tela, confere fluidez e abre passagem ao choque. Os choques produzidos pelas pinturas de Belo são, portanto, de outra natureza daquela jornalística. Eles se apresentam justamente pela via do realismo traumático conceituado por Foster1, no qual há um desencontro com o real. (…)”

(Trechos extraídos do Livro Seis Chaves, 1ª Edição, Editora Híbrida, Rio de Janeiro, 2012.)